Depois de anunciar que tem como meta chegar aos 82 mil pontos de carregamento em 2050, Luís Barroso, Presidente da MOBI.E, explica o crescimento da rede e o que se espera em 2024 para a mobilidade elétrica em Portugal.
Actualmente, com mais de 7200 pontos disponíveis e um crescimento de 45% nos carregamentos relativamente a 2022, a Mobi.E tem crescido a um grande. Em média são instalados 26 postos por semana, mas este crescimento vai ter de acelerar ainda mais.
O objetivo inscrito no Plano de Recuperação e Resiliência (ou PRR) aponta como meta 15000 postos já em 2025. Este marco implica que a MOBI.E terá de antecipar a instalação de 1000 postos, que estavam previstos para o período de 2026-2030. Luís Barroso explica-nos os próximos passos da MOBI.E.
O número de postos de carregamento MOBI.E e de carregamentos não para de crescer. A que se deve o exemplar crescimento da rede?
É um facto. Na minha opinião, este sucesso deve-se em muito ao modelo Mobi.E. Portugal foi dos primeiros países, em 2010, a estabelecer uma legislação específica para a mobilidade elétrica que veio a materializar-se no modelo Mobi.E.
Desde o início, estabelecemos regras claras e transparentes que permitiram construir de forma articulada um mercado estruturado, com características que facilitam o crescimento e, das quais, destaco:
i) a interoperabilidade obrigatória de toda a rede de acesso público que induz à racionalização dos investimentos e permite agregar mais facilmente toda a informação e disponibilizar em tempo real, por exemplo, o estado da rede a todos os interessados;
ii) a universalidade da utilização que faz com que toda a rede possa ser utilizada como um multibanco, ou seja, com um único cartão ou app válidos, um utilizador pode carregar o seu veículo em qualquer um dos mais de 7.200 pontos disponíveis em todo o país;
iii) a segregação da atividade da operação de pontos de carregamento que torna menos onerosa a sua instalação e exploração, promovendo o aparecimento de novos players e o crescimento mais acelerado da rede;
iv) a integração com o setor elétrico, que permite transportar a solução para os espaços de acesso privado que induz as empresas a criarem soluções de carregamento nos seus espaços para uso dos seus empregados e prestadores de serviços sem terem de suportar os custos dos carregamentos.
A acrescer a tudo isto, a manutenção de uma política consistente de incentivos quer fiscais, quer financeiros, o que permite que Portugal esteja a ser um exemplo de sucesso na transição energética dos transportes.
Quais são os principais objetivos da MOBI.E para 2024?
A MOBI.E vai continuar a ser um agente facilitador e indutor do crescimento da atividade dos agentes de mercado e, com isso, da rede Mobi.E.
Vamos manter a monitorização da rede, no âmbito do novo regulamento europeu publicado em setembro passado, denominado Alternative Fuel Infrastructure Regulation (AFIR), fazendo os desenvolvimentos na nossa plataforma de gestão que permitam potenciar os investimentos do setor privado. Em termos de investimento físico,
iremos promover com a colaboração de municípios, um novo piloto denominado “Ruas Elétricas”, que passa por instalar vários postos de carregamento mais lento em zonas residenciais sem parqueamento privado e iremos intensificar a nossa estratégia de internacionalização: i) ajudarmos outros Estados Membros a disporem mais rapidamente de uma solução agregadora de informação; ii) potenciar a exportação de serviços de empresas a operarem na rede Mobi.E, de forma a criarmos soluções de roaming internacional idênticas às dos telemóveis, ou seja, um utilizador da rede Mobi.E poder com o mesmo meio de acesso circular noutros países; iii) captar novas fontes de receitas que ajudem a reduzir os custos na rede Mobi.E.
Como entidade gestora da rede nacional de carregamento, a MOBI.E tem também um papel fundamental na comunicação da mobilidade elétrica. Como combatemos a desinformação?
Embora seja um papel fundamental da MOBI.E manter a opinião pública bem informada, esta atividade não a exercemos como Entidade Gestora (EGME), mas sim, enquanto instrumento público promotor do desenvolvimento da mobilidade sustentável, uma vez que a ERSE enquanto Regulador do setor não considera que estas campanhas de informação se enquadrem nas competências de EGME.
Sabemos hoje que, normalmente, quem opta por um veículo elétrico não regressa aos veículos a combustão. Desta forma, à medida que vamos tendo mais utilizadores de veículos elétricos, as reservas sobre autonomia, tempos de carregamento, capacidade da infraestrutura de carregamento e custos associados aos carregamentos tendem a esbater-se. Muitas das críticas vêm de quem nunca experimentou ou de quem desconhece.
A MOBI.E tem vindo a apostar fortemente no seu esclarecimento com iniciativas em diversas frentes, que vão desde artigos temáticos nos órgãos de comunicação social à participação em fóruns da especialidade e parcerias com outras entidades para difusão de informação. Também lançámos, no ano passado, uma coletânea de pequenos filmes “Mobilidade Elétrica num Minuto”, que estão disponíveis para visualização e aprendizagem na nossa página do YouTube, bem como temos informação detalhada no nosso site onde se destaca o Portal MOBI.Data, com dados em tempo real e evolução histórica da rede Mobi.E.
Por outro lado, as próprias empresas do setor têm-se dedicado cada vez mais a desenvolver ações de informação, pelo que, atualmente, é mais fácil ter acesso a informação credível e habilitada sobre a realidade da mobilidade elétrica.
A MOBI.E cobre já 100% do território português, mas continuamos a assistir a queixas por falta de disponibilidade de postos, especialmente dentro das grandes cidades ou em zonas muito remotas? Onde falta chegar?
Estamos numa fase de mercado embrionária e em forte expansão. Só nos primeiros 10 meses de 2023, o parque automóvel de veículos totalmente elétricos aumentou 50%, a um ritmo médio mensal de mais de 3.500 novas viaturas e, se acrescentarmos os veículos Plug In, o aumento médio mensal foi de cerca de 6.000 novas viaturas elétricas.
Por sua vez, a infraestrutura de carregamento também tem vindo a crescer com uma média mensal de cerca de 40 postos de carregamento instalados. Com incrementos desta dimensão, é natural que se sintam pontualmente algumas “dores de crescimento”.
“É mais rápido vender veículos elétricos do que instalar postos de carregamento.”
Luís Barroso, presidente a MOBI.E
Contudo se tivermos em atenção a informação que a MOBI.E disponibiliza no seu site desde abril do ano passado, no portal MOBI.Data, que permite aceder em tempo real à informação da disponibilidade da rede, verificamos que raramente o nível de utilização ultrapassa os 25% do número de pontos de carregamento disponíveis em cada momento, apesar de nestes 10 meses do ano, o número de carregamentos ter aumentado 64% e os consumos de energia 85%.
Já dispomos de pelo menos um posto de carregamento por município, os operadores de pontos de carregamento têm feito crescer a rede em função da procura, o que não significa que não haja pontualmente localizações com forte pressão na infraestrutura de carregamento, pois é preciso ter em conta que é mais rápido vender veículos elétricos do que instalar postos de carregamento.
De maneira geral, a grande capilaridade da rede Mobi.E e a dimensão atual estão adequadas à procura, isso mesmo, é confirmado com os níveis de potência disponíveis na rede que ultrapassam em cerca de 10% os níveis exigidos pelo AFIR.
Como é que Portugal está relativamente à Europa, na mobilidade elétrica?
No passado mês de setembro, foi publicado o AFIR que, sendo um regulamento, não necessita de transposição e é de aplicação obrigatória nos Estados Membros. Este regulamento vem instituir um conjunto de princípios que são muito coincidentes com os princípios do modelo Mobi.E, designadamente, a promoção da interoperabilidade, a acessibilidade da informação, a facilidade de uso pelo utilizador e a agregação da informação.
Como sabemos, o modelo Mobi.E é um sistema totalmente interoperável, permitindo que um utilizador possa usar toda a rede com apenas um único meio de acesso, tal como fazemos com o multibanco, onde o cartão de um banco é válido em todas as caixas multibanco independentemente se somos clientes ou não desse banco.
Além disso, desde o início, a MOBI.E agrega toda a informação da rede, o que permite divulgar em tempo real o estado de qualquer ponto, transmitindo uma maior confiança ao utilizador em encontrar, quando precisa, um ponto disponível e adequado para o seu carregamento.
Enquanto, para os portugueses, esta é uma situação trivial, nos outros Estados Membros não é bem assim, estão dependentes das soluções individuais de cada operador para carregar o carro que não são compatíveis entre si nem dispõem de um serviço que permita conhecer onde estão localizados e qual a situação agregada de todos os postos.
“Estamos muito bem preparados para assegurarmos a transição energética da mobilidade de acordo com as exigências da União Europeia”
Luís Barroso, presidente a MOBI.E
Desta forma, Portugal está bem posicionado quando comparado com os restantes Estados Membros. No entanto, o AFIR vem impor novos desafios também para Portugal, desde logo, critérios de dimensionamento da rede, garantia de infraestruturas de carregamento adequadas nas principais vias de ligação à Europa, as denominadas Redes Transeuropeias de Transportes (RTE-T), criação de uma infraestrutura de pesados, critérios para disponibilização de meios de pagamento físicos e criação de uma infraestrutura de abastecimento a hidrogénio.
Passado pouco mais de 1 mês após a publicação do AFIR, a MOBI.E divulgou publicamente as conclusões de um estudo com os seus impactos para que o mercado se possa preparar convenientemente para estes desafios.
De acordo com as conclusões deste estudo, iremos necessitar de instalar, até 2050, cerca de 76.000 pontos de carregamento, dos quais 1.600 terão capacidade para servir veículos pesados, e 37 estações de abastecimento de hidrogénio, num investimento global estimado de 1,7 mil milhões de euros e que permitirão ao País evitar a emissão de cerca de 3,3 milhões de toneladas de CO2, proporcionando um benefício económico estimado de 1,9 mil milhões de euros.
Desta forma, podemos concluir que estamos muito bem preparados e já temos conhecimento dos objetivos num horizonte temporal alargado para assegurarmos a transição energética da mobilidade de acordo com as exigências da União Europeia.
Como vê o futuro da mobilidade elétrica em Portugal?
A mobilidade elétrica irá continuar a crescer a um ritmo acelerado e temos tudo para continuarmos por longos anos a ser um bom exemplo a seguir, sem prejuízo de assistirmos pontualmente a alguns contratempos que não serão mais do que dores de crescimento, uma vez que a dinâmica que temos é já irreversível, a bem das condições de vida das gerações futuras.